novembro 25, 2014

Milagre é ponto de vista

A abordagem das pessoas para me perguntar sobre o Lucas tem acontecido com mais freqüência. Talvez eu esteja mais aberta a isso. Não tem esse lance da "lei da atração"? Pois é, ando mesmo numa fase de questionamentos internos. Ser questionada por outras pessoas, outros olhares, me tira da zona de conforto e vai além do que minha consciência tem coragem de confrontar.

E não vale ser qualquer questionamento. Sou exigente. Outro dia, estava no Ibirapuera com as crianças e um rapaz se aproximou, olhou o Lucas e começou a puxar assunto: "O que ele tem? Quando teve? ...". Muita gente usa experiências próprias pra criar alguma identificação. O rapaz começou a me contar que tinha um primo que teve paralisia infantil e uma outra prima que tinha atraso de atenção. Ops! Acho que o rapaz quis dizer déficit de atenção. Ri por dentro. Me despedi do rapaz e fui correndo, e empurrando o Lucas, atrás da Clarinha que já estava em outro brinquedo.

Na amarelinha, Clara observava uma menina que não tinha muita afinidade com a brincadeira e arriscava uns pulinhos. O pai da menina, que tinha um olho na filha e outro no Lucas, convidou a Clara pra se juntar à brincadeira. Não me lembro qual foi a abordagem desse pai com relação ao Lucas, acho que foi algo parecido com o rapaz de uns momentos antes, bem normal. O diálogo seguiu assim até ele me perguntar:

"- Você crê na recuperação dele?"

Diante dessa pergunta, e de alguns outros comentários proferidos durante o nosso diálogo, saquei que o cara era evangélico e entendi a que tipo de "recuperação" ele se referia.

"- Olha, sou muito realista. Não acredito em milagre. Tenho conhecimento pleno de sua deficiência, aceito e amo do jeito ele é. Acho que esperar do Lucas mais do que ele pode me dar só gera frustração pra mim e pra ele, que sente a cobrança e a aflição das expectativas e não consegue corresponder à altura."

O assunto Lucas acabou aí. As meninas continuaram na amarelinha e o foco do assunto se voltou pra brincadeira.

Na correria do dia-a-dia, algumas sutilezas do Lucas acabam passando despercebidas. Há cerca de um mês, decidimos pegar uma outra cachorra, outra pitbull. Durante toda a semana, o assunto em casa foi a visita ao canil no final de semana pra conhecer os cachorrinhos e quem sabe trazer um pra casa. No sábado dessa semana, dia em que havíamos combinado a visita, o Lucas acordou muito animado, pura excitação! O canil fica em Guararema, cerca de 40 minutos de São Paulo. Durante todo o trajeto ele foi assim, animadíssimo, mexendo as pernas, sorrindo, ofegante. Lucas costuma ser bem alegre, mas estava acima do normal. Chegando ao canil, haviam quatro filhotinhos. Umas fofuras! Colocamos os bebês no colo do Lucas, que continuava muito feliz. Os filhotes ainda precisavam ser vacinados e vermifugados, então, fomos embora sem levar nenhum deles. No caminho de volta, o Lucas foi chorando a viagem toda. Eu, preocupada que ele estivesse desconfortável na cadeirinha do carro, pulei pro banco de trás e comecei a massagear suas pernas tentando deixá-lo confortável. Sem sucesso. Meu marido teve um estalo e se lembrou da animação do Lucas na ida. A insatisfação do Lucas não era de um desconforto físico. Sua dor era interna, era decepção. Ele chorava porque estava voltando pra casa sem a cachorrinha que tanto falamos que íamos pegar durante a semana.

Não estou aqui para discutir fé, muito menos religião. Poupo-me de acreditar no milagre que "cura" (em nome de Jesus!) deficientes severos e os fazem levantar de suas cadeiras de rodas e sair andando e falando. Pra mim, o Lucas é um milagre. Cada instante da sua existência, suas manifestações sutis, sua força, sua alegria, sua serenidade diante do caos em que vivemos, isso sim é um milagre!



setembro 16, 2014

A resposta pra minha última postagem veio mais rápido do que eu esperava...


Clarinha batendo um papo com os amigos da rua que acabaram de ver o Lucas.

O amigo: Pq seu irmão tá parado?
Clara: Pq ele é assim!
Amigo: Ele é assim, parado?!
Clara: É!
Amigo: Sempre?
Clara: É, ele é parado sempre.
Amigo: Pq?
Clara: Pq ele é assim ué!

setembro 09, 2014

O natural é especial

Quando uma criança se dirige a mim perguntando o que o Lucas tem, muitas vezes me atrapalho e não sei bem o que dizer. Aqueles olhinhos brilhando de curiosidade, parecem esperar ouvir algo tão fantástico quanto as histórias contadas pela professora ou qualquer outra maluquice que elas assistem nos desenhos e animações.  

Dizer que ele tem paralisia cerebral ou que é deficiente seria um balde d'água totalmente sem sentido. Na maioria das vezes digo que ele é especial.

"Especial por quê? O que é que ele faz para ser especial?".

Especial, para as crianças, é ter super poderes, salvar o mundo, voar, morar num reino encantado. Um menino, que não fala, quase não se move, sentado numa cadeira de rodas... O que há de especial nisso?

Outro dia, fomos a um churrasco de amigos. O Lucas estava deitado numa espreguiçadeira à beira da piscina onde outras crianças brincavam. Uma menininha se aproximou e perguntou: "Tia, o seu filho morreu?". A mãe da menina, que estava ao lado, ameaçou iniciar uma bronca na garotinha. Eu, rindo, interrompi. Pobre... A pequena só estava querendo matar sua curiosidade. Tudo bem, que para isso, ela tenha precisado matar meu filho em sua imaginação.

Eu me divirto com as questões das crianças. Tão genuínas, sem maldade. Há pessoas que agridem, mesmo sem pronunciar uma única palavra. O silêncio, o olhar (ou o não olhar) podem ser devastadores.

A Clara não contesta a condição do irmão, não pergunta nada sobre ele. Pra ela é natural: nasceu e o irmão já era assim. Conto isso pra outras pessoas e elas acham incrível que ela tenha essa naturalidade com o "diferente".

Eu me preocupo. Acho que o normal é a criança perguntar. Fico imaginando quando seus amigos começarem a fazer perguntas sobre seu irmão. Como é que ela vai saber o que responder?

Talvez eu deva dar respostas à ela.

Talvez, dentro dela, já existam respostas.

Talvez as respostas dela sejam bem melhores que as minhas.

Talvez eu deva perguntar à ela e, assim, aprender a responder com a mesma naturalidade com que ela estabelece sua relação de amor com o irmão.

 

abril 23, 2014

Artrodese, só pra concluir


Hoje, na verdade, é dia 8 de Setembro. Fazem 5 meses que o Lucas realizou a cirurgia da coluna. A data da postagem é do dia em que foi feita. Demorei pra voltar aqui e postar sobre o assunto.

Na real, logo depois da cirurgia, comecei a preparar um diário do pós-operatório, assim como fiz com o VEPTR, mas desisti de postar. Parei pra dar uma lida geral no blog e notei que a escoliose do Lucas acabou virando o assunto central por aqui. Uma chatice! Tá explicado porque perdi tantos seguidores... Peço desculpas a essas pessoas pela minha redundância.

Acho que durante os 4 anos que esperei por esse dia, eu vivi num banho-maria cozinhando lentamente a minha coragem para encarar esse desafio. E o blog sempre foi um espaço onde eu pude colocar pra fora os meus tormentos e, talvez, me ajudar a enfrentá-los.

Com relação à cirurgia, basta dizer que, dentro do esperado, correu tudo bem. Já o pós-operatório foi excelente: menos dor, menos tempo de internação e cicatrização mais rápida do que o esperado. Não posso deixar de dizer que ter o apoio do pai do Lucas (e meu marido) durante todo processo, desde os meses que antecederam a cirurgia, foi fundamental e de muito valor.

O resultado da cirurgia pode ser visto na foto abaixo. A foto da esquerda é antes da cirurgia, ainda com o VEPTR. A da direita, já com as hastes e os parafusos (impressionantes) da artrodese. A correção não foi significativa, pois a coluna do Lucas já estava bem rígida. O importante é que a escoliose não irá mais evoluir. E a dor, que o Lucas andava sentindo antes da cirurgia, e a gente pensava ser do quadril, passou.

Sentimento de gratidão e de encerrar um ciclo. Acabou. Sobre o assunto "coluna", eu espero sinceramente que não precise mais falar dele por aqui. Daqui pra frente é vida nova pro Lucas e pra esse blog.

Dá-lhe!

abril 09, 2014

Onde está a caixa?

Estou em fase intensa de testes. Tipo final de bimestre escolar, momento de fazer as provas pra avaliar o que se aprendeu até agora. Ainda bem que não tenho mais que prestar contas das minhas notas pros meus pais, nem tenho uma mesada que dependa de notas azuis. O lance agora sou eu comigo mesma, ou com Alguém que não está preocupado com notas, mas com evolução.

Na quinta-feira, recebi uma ligação da secretária do ortopedista de coluna do Lucas adiando a cirurgia pro dia 10, isso porque a caixa com o material para a retirada do VEPTR não estava em SP. Passei quatro dias com dor de barriga, estômago embrulhado, intestino solto e sem apetite. Perdi 3 quilos.

Ontem, recebi outra ligação da secretária do ortopedista. Adivinha só? A cirurgia foi adiada mais uma vez, pro dia 23, porque a tal caixa não está no Brasil! Tenho a impressão que meu cérebro se diluiu e desceu pelo esgoto, junto com meus 3 quilos, pois as únicas palavras que consegui pronunciar foram: "Ah tá!".

Temo que uma próxima ligação, da secretária, seja pra dizer que a caixa não está mais no planeta Terra... Demoramos tanto tempo pra decidir fazer essa cirurgia, e agora que resolvemos fazer parece que é ela está fugindo de nós. Se até dia 23 essa caixa não aparecer, vou atrás dela onde estiver, pego um foguete, vou até Marte se preciso, tudo para não ter que adiar nem mais um dia.

A espera pode ser uma tortura. Pra fugir dela, tenho sentido vontade de andar por aí, entrar no carro, ligar o som e sair dirigindo, sem rumo. Depois da ligação de ontem, fiquei bem desnorteada. Deixei minha caçula na escola e, com o Lucas no carro, fui a caminho do consultório do ortopedista (ele mesmo, o da caixa desaparecida). Eu precisava ir lá, olhar nos olhos do homem a quem vou confiar o meu filho daqui há alguns dias, apenas pra lhe dizer o quanto está difícil pra mim e que estou com medo. No momento, pra mim, ele é a primeira pessoa que está abaixo de qualquer divindade a quem tenho oferecido minhas orações. Aliás, ele está em minhas orações. Ele é o único ser encarnado a quem eu senti a necessidade de dizer o quanto essa espera está acabando comigo, mas também dizer o quanto confio nele.

"Fique calma", ele me disse.

Abraçada por um olhar extremamente seguro, meus sentimentos foram acolhidos naquela sala, cercada por diplomas, livros e maquetes de coluna.

Um afago, mas com um lembrete: os testes ainda não terminaram.

Imagem daqui

abril 02, 2014

3, 2, 1... Aprumar!

A semana começou apreensiva, angustiada. Tive quatro anos para aceitar a ideia de que esse dia chegaria, e ainda assim só me rendi por falta de opção. Chegou a hora de nos despedirmos dos calços e aprumar definitivamente a coluna do nosso menino. Fim de linha pro VEPTR. Artrodese, aí vamos nós.

O Lucas tem sentido dores nas costas e sua coluna continua a entortar, além do que sua bacia também está cada vez mais desalinhada. Tem sido difícil o Lucas permanecer por muito tempo sentado na cadeira de rodas. Ele fica desconfortável e com marcas de pressão dos apoios laterais que sustentam o seu tronco. Com uma "coluna nova", poderemos ter uma cadeira mais confortável, sem tantos apoios e apertos. Também não precisaremos mais passar pelas distrações, que aconteciam a cada 4 ou 6 meses, para permitir o crescimento da coluna (foram 7 no total, a última em dezembro). De certa forma, será uma libertação!

Tenho feito muitos planos pro Lucas para o segundo semestre. Escola, esporte, lazer, um curta... Minha cabeça está a mil! Talvez seja uma maneira de não deixar espaço pros pensamentos perturbadores. Tenho procurado me manter calma para encarar com serenidade os dias que virão, mas é incrível como a nossa mente pode ser tão cruel com nós mesmos, gerando medo e angústias.

Fiquei bem traumatizada com o pós-operatório do VEPTR. É uma memória difícil. Não posso imaginar meu filho passando novamente por tanta dor. Essa é minha grande preocupação. Sempre é. Escolher o caminho que gere menos sofrimento pro Lucas. A artrodese é uma cirurgia de grande porte, é agressiva, que pode ter um pós-operatório doloroso, mas a longo prazo trará qualidade de vida pro Lucas. Não fazer essa cirurgia, pode poupá-lo dessa dor inicial, mas a longo prazo as complicações podem ser sérias, desde ele não conseguir mais sentar até a compressão pulmonar e de outros órgãos.

Escolhas difíceis. Ainda mais por se tratarem de decisões sobre a vida de outra pessoa. E essa outra pessoa é meu filho. Se dói nele, dói muito mais em mim. A culpa dói.

A verdade é que não sabemos como será de fato. A maioria das crianças que conheci, e que fizeram essa mesma cirurgia, se recuperaram muito bem e rapidamente. Conheci casos de pais que optaram por não fazer, e que os filhos não estão mais aqui.

É um risco. Viver é correr riscos.

A escolha está feita. A cirurgia foi marcada pro dia 07/04 adiada para 10/04 23/04. Me conforta a certeza de que o Luquinhas está nas mãos de um excelente médico, e de uma equipe especializada e muito competente. E todos sob a supervisão zelosa do Divino.

Na contagem regressiva dos dias, aproveito para me aprumar: descansar, juntar energias, fortalecer corpo e mente pra estar bem ao lado do meu guerreiro para o que ele precisar.

Juntos somos (muito) mais fortes!

março 28, 2014

Salve a arnica!

Quando o Lucas era bebê, eu fazia muita massagem nele. Acho que por causa desse estímulo inicial, até hoje ele adora ser massageado, e eu estou sempre em busca de bons óleos. 

Há uns anos atrás, ganhei uma amostra do óleo de arnica, da Weleda, e me apaixonei, ou melhor, nos apaixonamos porque o Lucas também adorou! Além do cheiro delicioso e da textura densa desse óleo, a arnica tem diversas propriedades medicinais: cicatrizante, anti-inflamatória, antipirética, indicada para contusões, hematomas, entorses, distensões, estiramentos, cãimbras, inflamações de articulações e tendões. 

No caso do Lucas, esse óleo alivia a tensão e as dores musculares causadas pela espasticidade, aquece levemente a pele proporcionando conforto e relaxamento, ótimo pra usar depois do banho. Quando o Lucas vai fazer algum procedimento cirúrgico, faço um tratamento intensivo pré-operatório, aplicando na área onde será a cirurgia para preparar a pele. Isso ajuda na cicatrização e evita hematomas que podem surgir no pós-operatório. Durante o processo de cicatrização, eu interrompo o uso e só volto a aplicar o óleo na área quando a pele está completamente cicatrizada. 

Estamos iniciando esse tratamento intensivo hoje, pois daqui há exatamente dez dias o Lucas finalmente fará a cirurgia definitiva da coluna. Como é um procedimento complexo (pra não dizer grande), procurei um homeopata pra reforçar o tratamento. O médico receitou uma homeopatia de arnica, de uso oral, pro tratamento pré e pós-operatório. Assim, mesmo quando eu não puder usar meu super óleo, ainda assim teremos a nossa grande aliada arnica presente! 

março 23, 2014

Meu filho tem paralisia cerebral, alguém tem que pagar por isso

A vida machuca. Algumas vezes mata, outras aleija. Pode também te presentear com um filho deficiente. Alguns defendem a ideia de que essas crianças são uma benção, de que são anjos enviados para pessoas especiais, ou ainda que estão aqui pagando algum tipo de carma de uma vida passada. Palavras que não consolam e não trazem nenhum benefício aos que convivem com as dificuldades de ter uma pessoa com deficiência na família.

Meu filho, Lucas, tem paralisia cerebral. Nasceu assim. Teve uma lesão cerebral causada por um sofrimento fetal. Eu não tinha um convênio médico na época, ele nasceu num hospital público da cidade de São Paulo. Não tive nenhum gasto durante o período em que ele precisou ficar internado. A partir daí, tive que contratar um plano de saúde para garantir assistência pro Lucas, porque todos sabemos que o sistema público de saúde no Brasil não funciona como deveria.

Muita gente nem sabe da existência do Lucas. Seu nascimento, traumático e com sequelas graves, não foi manchete em nenhum jornal. Compreensível, já que é filho de dois desconhecidos. O pai, na época, iniciava sua vida profissional, a mãe, no caso eu, mal havia terminado os estudos. Jovens, tivemos que lidar com o espancamento emocional dos pesarosos comentários médicos sobre o futuro do nosso filho.

Esses discursos foram bastante dolorosos. E piores ainda vieram. A realidade hoje é: Lucas não será curado. Não andará ou falará. Vive uma vida limitada, completamente dependente dos outros. "Se daqui a 30 anos um gênio criar um tratamento capaz de reverter sua lesão, ótimo, mas não está no horizonte da ciência". Infelizmente.

Por enquanto, nossa preocupação é proporcionar a ele uma melhor qualidade de vida. Para isso precisamos de dinheiro, muito dinheiro. Lucas não tem a sorte de receber apoio de nenhum famoso, como Luciano Huck e Rubinho (nem pra doar, nem pra divulgar uma vaquinha). O jeito é se virar! Deixar de trocar de carro, de reformar a casa, de fazer uma viagem, de comprar uma roupa ou um brinquedo novo pra nossa caçula. Nem pensar em se render a algum luxo! Temos que economizar ao máximo pra conseguir pagar um bom convênio médico pro Lucas, comprar suas medicações, fraldas, dietas especiais e equipamentos ortopédicos. Isso é o mínimo que ele precisa. Nem coloquei na conta tudo o que eu gostaria de oferecer à ele, e não posso, que nem convênio e nem governo bancam.

Em português claro, NÃO tem grana do poder público (e nem de vaquinha de famoso) para as cadeiras de rodas, para as sondas, equipamentos, remédios, tratamentos, enfermeiros e cuidadores, do Lucas e de tantos outros deficientes anônimos espalhados por aí, filhos de vendedoras, metalúrgicos, professores, donas de casa, desempregados,... Quantos somos!

O governo tem obrigação de dar assistência aos deficientes brasileiros. Os políticos, que "ganham" a sua graninha para manter seus luxos particulares, tem que se preocupar em investir recursos para promover assistência de qualidade aos deficientes e seus familiares. Isso inclui o Lucas, a Laís Souza, a Mariazinha, o Huguinho, o Zezinho, o Luizinho... TODOS os deficientes brasileiros!

Enquanto eles não fazem nada, se você pode fazer algo pelo Lucas ou por outro deficiente anônimo, faça, por favor.


* Disponibilizo o espaço dos comentários para quem precisa receber algum tipo de ajuda, para que divulgue uma conta bancária, o contato e a sua necessidade.

**Agradeço ao André Forastieri que colaborou, mesmo sem saber, para que essa postagem fosse escrita. Alguns trechos foram reproduzidos e baseados em seu texto que trata sobre Laís Souza e a falta de auxílio da COB em seu tratamento.

março 18, 2014

10 anos depois...

Como eu precisava ir ao Poupatempo renovar minha carteira de motorista, aproveitei pra tirar a segunda via do RG do Lucas, pois o antigo estava ficando um caco.

O primeiro RG do Lucas foi tirado em 2003, ele ainda não tinha completado 2 anos. Lembro de ter levado ele numa dessas lojas que revelam filmes e que tiram fotos para documentos. Foi um sacrifício fotografar ele, tive que fazer contorcionismo pra segurar sua cabeça e não aparecer na foto. Além do que, essas fotos são super caras levando em conta o quanto saímos bem nelas... E se não bastasse uma, temos que engolir nove delas. Por isso optei por tirar a foto em casa mesmo. Tirei umas 30 fotos até ter uma legal. Depois usei o Photoshop pra realçar cor e brilho, fiz uma montagem com nove fotos e mandei revelar. Gastei 1 real e de brinde ganhamos um documento mais feliz!

Pra agilizar, agendei o atendimento pela internet no Poupatempo da Lapa (em São Paulo). Em frente a esse Poupatempo, tem vagas reservadas para deficientes e idosos, basta ter o cartão DeFis-DSV para identificação do carro. O local também possui rampas de acesso para cadeirantes. Com relação ao atendimento, levamos cerca de 1 hora e meia pra fazer a renovação da minha CNH e tirar o RG do Lucas, que demorou uns 20 minutos pra ficar pronto. Uma maravilha! 



A única coisa que não ajudou muito no dia foi o tempo. Olha só a chuva que pegamos no caminho.

março 05, 2014

Ah lá lá Ô ô ô ô...

Nossos dias de folia foram um Carnaval, literalmente. De otite à confete na orelha, de tabela de medicações à programação de bailes de carnaval. Uma loucura boa demais com muita alegria, fantasia, música, dança, cuidado, uma dose de antibiótico alternada com bela requebrada.

As batucadas de emoção começaram nas vésperas do carnaval. Lucas ouvido e Clara garganta. Pelo menos os dois dançaram a mesma música, a marchinha pneumococica. Mesma medicação, mesmos horários. Harmonia perfeita!

Depois de iniciar com o antibiótico, mestre sala e porta bandeira precisaram de apenas um dia de repouso pra estarem prontos pra exibir seu estandarte da alegria.

No quesito fantasia, muita criatividade! Tivemos pirata inspirado no curta do momento, princesa, índio e bailarina.

Melhor enredo, melhor remédio.

Nossa escola é campeã!

março 02, 2014

Curta "Cuerdas". Não compartilhe.


Anda circulando na internet um vídeo emocionante que mostra a relação de amizade entre duas crianças muitos especiais. Trata-se da animação "Cuerdas", vencedor do prêmio Goya 2014 na categoria melhor curta de animação, escrito e dirigido pelo espanhol Pedro Solís. A animação é inspirada na convivência de seu filho Nicolás, que tem paralisia cerebral, e sua filha Alejandra. "O resultado é mais que uma lição de igualdade e solidariedade mas também é, de certo modo, um espelho que reflete todo o sacrifício através do amor que o espectador vive em primeira pessoa pelos olhos inocentes e puros de uma menina", descreve o próprio diretor.

O curta ainda não foi disponibilizado oficialmente e tem sido compartilhado de forma ilegal. No site oficial, há a informação de que o lançamento será anunciado via Facebook e Twitter. A equipe de Cuerdas tem se manifestado pelas redes sociais e fazendo um apelo para que as pessoas não compartilhem o vídeo pois isso é extremamente prejudicial para eles, além de violar os direitos do autor, existem festivais de cinema que não admitem vídeos que estejam disponíveis na rede.

A seguir, o trailer do curta "Cuerdas" (autorizado) com a mais sincera gratidão pela obra e o desejo de que todo o ensinamento e amor que há nesse vídeo seja retribuído da melhor forma ao diretor e sua família.



Imagem daqui 

fevereiro 28, 2014

Dentinhos apegados

Quando um dente permanente começa a se formar, a raíz do dente de leite correspondente é absorvida por ele, o dentinho de leite fica sem sustentação e cai. Assim é para a maior parte das crianças.

Em algumas crianças com paralisia cerebral, pela falta de mastigação ou pouco estímulo oral, pode acontecer de os dentes de leite não caírem. Outro fator que pode contribuir pra esses dentinhos apegados não caírem é a hiperplasia gengival que é um aumento da gengiva causado pelo uso contínuo de algumas medicações, normalmente anticonvulsivantes.

No caso do Lucas, ele tem esse aumento da gengiva e também a falta de estímulo oral (por conta da alimentação pela gastrostomia). Consequentemente, alguns dos dentes de leite teimaram em permanecer na boca do garotão!

Apesar de bonitinhos, os dentes de leite precisam ser removidos pois eles podem cair a qualquer momento (durante a noite, por exemplo) e serem engolidos ou aspirados, o que não seria nada legal. Além do que, esses dentes comprometem o nascimento dos dentes permanentes que acabam perdendo a força de erupção com o passar do tempo. O que acontece daí é que os dentes não nascem ou podem nascer no lugar errado.

Em agosto do ano passado, iniciamos a extração desses dentes de leite no Lucas. Foram arrancados, com anestesia local, cinco dentes no maxilar inferior (um canino, primeiro e segundo molares de ambos os lados). No dia da extração o Lucas teve um pouco de febre e dor, mas nada que um analgésico não desse conta. A dentista cogitou a possibilidade de entrar com um antibiótico, mas não foi preciso. No dia seguinte ele ficou bem e não precisou tomar mais nada.

Na última sexta feira, retornamos para dar continuidade às extrações, dessa vez no maxilar superior. O planejado era arrancar quatro dentes, mas como o Lucas estava com um pouco de tártaro a dentista optou por fazer uma limpeza e arrancar apenas dois dentes do lado esquerdo (canino e primeiro molar). Ela explicou que não é legal fazer limpeza estando com muitas feridas abertas que são portas para bactérias. Tanto é que depois de retirar o tártaro ela fez uma super assepsia na boca do Lucas antes de iniciar as extrações, que mais uma vez foram feitas com anestesia local.

O próximo passo é arrancar os mesmos dentes do lado direito.

Trabalho em massa pra fada do dente por aqui! :)

Imagem daqui

fevereiro 11, 2014

Tributo a um anjo de quatro patas

No final do ano passado tivemos uma grande perda, nossa cachorra Duna, uma pitbull de 6 anos, partiu. Quem tem ou já teve animal de estimação sabe o quanto nos apegamos a eles, como viram parte da família e o quanto é difícil quando eles nos deixam.

Só depois de quase 2 meses é que consigo escrever sobre o assunto, ainda que a saudade aperte meu coração e encha meus olhos d'água... E o que isso tem a ver com esse blog? Duna foi um presente muito especial dado ao Lucas, juntos os dois construíram uma linda amizade e escreveram uma história de amor e superação.

Abaixo segue uma matéria publicada em 2008 que conta como tudo começou.

Basta clicar nas imagens para visualizar melhor.



Trecho da matéria: "Em uma dessas visitas, era noite, os cachorrinhos iam mamar e um filhote, o único marronzinho, deixou de ir mamar e sentou do lado do Lucas apoiando a cabecinha em sua perna. Era a Duna." 

Em seus últimos momentos de vida, com tantos lugares para se deitar, Duna buscou aconchego numa almofada do Lucas. Chegou e partiu buscando conexão com o seu melhor amigo. ♥

Obrigada, Duna, por todos os momentos incríveis que vivemos, por todo carinho e cuidado que você teve com o Lucas e até pelas mordidinhas que você deu nele. Você foi uma cachorra incrível, muito especial mesmo, e deixou o melhor presente que a gente poderia ter, que é essa linda história. Para sempre você estará em nossos corações e memória.

Descanse em paz.

 Duna 28/03/2007 - 29/12/2013 ✝


fevereiro 07, 2014

Simples como um copo d'água

Ontem o Lucas esteve numa consulta pra programar a troca da gastro. Não vou me estender explicando o que é a gastro, isso é assunto pra um outro post. O assunto aqui é outro.

Fazia um calor de 35 graus, que pude constatar no termômetro do relógio na rua que registrei a caminho da clínica. Enquanto esperávamos a consulta, vi chegar uma moça que carregava no colo um menino de uns 6 ou 7 anos. No outro braço ela levava os exames, a bolsa, segurava na mão a carteirinha do convênio e documentos para entregar à recepcionista. Acordado, o menino se mexia pra lá e pra cá, e algumas vezes suas costas pendiam pra trás num movimento de extensão. Estava claro que ele tinha alguma deficiência.

Eu estava num lugar privilegiado e pude observar a cena como numa tela de cinema, ou melhor, num palco, o palco da vida. Só que nesse caso o palco era a sala de espera... lotada. A mulher com seus pertences e o filho no colo, em pé ao balcão, se desdobrando pra fazer o cadastro e abrir a ficha pra consulta. Quando enfim pôde sentar, se abanava, abanava o filho, enxugava o rosto. Estava exausta. Seu semblante era tenso, sobrancelhas franzidas, séria, não se deu ao trabalho de levantar o olhar e permitir que o seu cruzasse com o de qualquer outra pessoa que estivesse ali. Ela sabia, todos os olhares estavam nela. Olhares paralisados por pensamentos limitadores.

Eu também olhava, mas de uma forma diferente. Era como uma visão periférica. Eu via a moça com seu filho, mas o que me chamava mais a atenção eram as pessoas em volta, aqueles olhares congelados. Pra mim era fácil olhar pra moça e enxergar além, ver o que realmente aquela moça precisava naquele momento. Eu já estive na situação dela. Muitas vezes eu sou essa mulher.

Eu tenho fé nas pessoas, acredito sinceramente que todo mundo nasce com uma sementinha do altruísmo plantada em seu coração. Fiquei esperando que alguém saísse daquele estado zumbi, que lutasse contra a sua curiosidade, piedade ou seja lá o que for que o torna tão passivo diante de uma oportunidade de ser generoso, alguém que se levantasse e fizesse algo pra aliviar a tensão daquela mulher.

Não foi dessa vez, infelizmente.

Me levantei, fui em direção ao filtro, enchi um copo com água gelada e ofereci à moça que arregalou os olhos e fixou seu olhar no meu por uns 5 segundos. Pegou o copo da minha mão e disse: "Água! Nossa, era tudo o que eu estava precisando. Muito obrigada.". Um largo e sincero sorriso iluminou seu rosto, iluminou aquela sala de espera inteira, iluminou o meu coração. Nesse momento, todos os olhares se dispersaram em estilhaços, provavelmente, de vergonha.

O mundo precisa que as pessoas olhem além, que se libertem dos pensamentos que congelam sua generosidade.

A felicidade do outro pode começar num simples copo d'água.

Uma sugestão de vídeo dentro do tema:

janeiro 30, 2014

Lições do Universo













Minha vida não tem nada de homeopática, é tudo em doses cavalares. Quando ela vem pra ensinar, é muito boa nisso! É dura, cruel, a ponto de me fazer curvar diante dela. E acho q é isso mesmo que ela pretende... Assim, só me resta erguer a cabeça pra receber as recompensas que ela tem a oferecer. E quando minha vida resolve ser generosa, aaaahhh... ela é melhor ainda!!

Pra mim, as dificuldades são parte de um processo de preparação pra receber as coisas boas. Por essa razão, sou grata aos momentos bons e também aos difíceis.

Sem a tempestade, a bonança não teria o seu devido valor.

Imagem daqui

janeiro 29, 2014

Calor no corpo



No paraíso, a temperatura sobe. 
Calor na mata e no corpo. 
Não é tesão, é febre! 

O bote inflável, comprado horas antes 
de pegar a estrada, está furado. 
Parecia saber que não cumpriria 
o que lhe era destinado. 

A febre volta. 
Os amigos começam a chegar. 
A preocupação também. 
Corre pra comprar outro antitérmico 
porque vai ter que intercalar. 

Dipirona. Não pira. 
Alivium. Não alivia. 
Paracetamol. Parece que tamos mal...
Apela pra compressa gelada que passou de 38! 
Será garganta? Ouvido? 
Infecção urinária? Algum problema na prótese? 
Por favor, quero uma bola de cristal! 

A volta terá que ser antecipada. 
O PS nos aguarda.
Colhe sangue, urina, raio-x. 
Expectativa. Espera. 
Tudo normal. 
Mas e a febre que não cede?! 
Há uma hipótese:
se não tem infecção por bactéria,
pode ser uma virose.

janeiro 20, 2014

As piores frases que já ouvi de profissionais

O que se esperar de alguém que trabalha na área da saúde, que cuida de outras pessoas? No mínimo que sejam humanas e tratem seus pacientes com respeito e delicadeza, certo? Mas não é bem isso o que acontece por aí, infelizmente.

Eu, em minhas diversas passagens por consultórios e avaliações médicas com o Lucas, já ouvi absurdos que ficam ainda mais cabeludos se levarmos em conta que TODOS foram ditos na presença do Lucas. Será que isso era mesmo necessário?

Selecionei algumas pra contar pra vocês:

1- "O quadro dele é muito grave. Sinto muito por vocês. Por que não tentam ter outro filho? - neurologista
O Lucas tinha em torno de um ano nessa época e era a primeira vez que o Antonio (pai do Lucas) nos acompanhava a uma consulta. Me lembro como se fosse hoje do impacto que essas palavras tiveram sobre meu marido, a imagem de suas lágrimas enquanto dirigia na volta pra casa. Pelas muitas histórias que já cruzaram o meu caminho, histórias tristes de abandono em famílias com crianças especiais, é assustador pensar que essas palavras poderiam ter criado um abismo de distanciamento entre o Lucas e o seu pai. Felizmente não foi o que aconteceu. 

2- "Ele não é aceito aqui porque seu quadro é grave demais." - fisioterapeuta
Quando o Lucas recebeu o diagnóstico de paralisia cerebral e foi encaminhado pra reabilitação, saí em busca de lugares onde ele pudesse ser assistido e realizasse as terapias necessárias. O primeiro lugar onde busquei auxílio foi no mais óbvio, uma associação que se entitula de assistência à criança deficiente. Mas não à todas as crianças deficientes, somente as com deficiências física e mentail com possibilidade de reabitar e desligar do atendimento. Lucas precisaria de fisioterapia por toda sua vida. Isso eu descobri com o balde de água fria durante sua avaliação. Como o Lucas tem um déficit motor, visual e intelectual, considerado múltipla deficiência, não foi aceito para reabilitação por protocolo da Instituição.

3- "Seu filho não vai andar, não vai falar... Não há o que se fazer por ele, apenas deixá-lo sobre uma cama e oferecer cuidados básicos." - fisiatra
Lucas tinha meses de vida. Como não foi aceito onde eu esperava que seria, saí em busca de outras opções. Foi durante uma avaliação no Sesi que ouvi essa frase. Gostaria de reencontrar essa médica pra contar à ela tudo o que o Lucas fez depois dessa consulta. Além das terapias que fui buscar lá (hidroterapia, fisio, fono e terapia ocupacional), meu filho frequentou escola, dançou, se apresentou no teatro, andou de cavalo, de barco, foi à praia, à cachoeira, viajou de avião, viveu experiências incríveis e incontáveis momentos de alegria. E quer saber de mais uma coisa? Ainda há muito mais o que se fazer por ele. 

4- "É bem provável que seu filho não tenha os dentes permanentes" - dentista
Os dentes incisivos de leite do Lucas tinham caído e não estavam nascendo. Preocupada, procurei um dentista "especialista" em crianças especiais, do plano de saúde. Após examinar (sem radiografar) ele concluiu a ausência dos dentes permanentes. Inconformada, procurei outra dentista especialista, dessa vez particular, que radiografou durante a consulta mesmo e... lá estavam os dentões! A doutora explicou que como o Lucas não mastiga alimentos sólidos, os dentes acabam perdendo a força de erupção e é preciso usar uma escova para estimular e ajudar o nascimento dos dentes. 

5- "Vocês sabem que ele vai morrer antes que vocês. Devem se preparar pra isso." - neurologista
Frequentamos por alguns anos o consultório dessa médica. Ela era muito competente, suas consultas eram longas, ouvia o que dizíamos com atenção e levava tudo em consideração (raridades em consultas com médicos de plano de saúde). Eu e meu marido sempre lidamos de forma muito leve e natural com a deficiência do Lucas, procurando manter o astral elevado com bom humor. Parece que tem pessoas que não entendem a nossa alegria. Acho que com essa médica acontecia algo assim... Bastava que a gente descontraísse durante a consulta, contássemos nossas peripéricias com o Lucas em nossas viagens de férias, que lá vinha ela com esse papo pesado. Ninguém está preparado pra morte de alguém querido, nem de um filho, nem dos pais, dos avós, de um amigo, do animal de estimação... O sofrimento e a dor da perda existirão sempre, sejam nas perdas que seguem a ordem natural ou não. A morte é a única certeza que temos na vida. Não interessa pra quem ela irá chegar e quando. Há de se aprender a viver com essa certeza tão incerta. Estamos todos de passagem.

Sejamos capazes de exercer o melhor de nós e, dessa forma, contribuir pela melhor passagem de todos os que cruzam nossos caminhos. Sejamos capazes de exercitar a empatia um pelo outro, por nós. Juntos somos cura!

 "Não queira adicionar dias a sua vida, mas vida aos seus dias."
Harry Benjamin, médico alemão, Jan/1885-Ago/1986✝